Da calçada, não degrau, de Historiadora, da toga da qual não consigo me despir porque é a única roupa que tenho, em casa e na rua, que eu falo sobre o nosso Tempo Presente: a História produzida pelos Cursos Universitários é Ciência composta de Teorias e Métodos. Ser historiador é ser portador das ferramentas, instrumentos e conhecimento para o Trabalho científico de Pesquisa e Produção de textos históricos.
Da posição de Trabalhadora da História que eu falo.
Da calçada e não da rua é que escrevo porque a calçada é, a princípio, o espaço da segurança do pedestre, do transeunte que atravessa a cidade, o espaço da Política (ágora do toque e da palavra). A rua é perigosa e já não sou tão ágil, como na juventude. E fui muito! Mas nas calçadas brasileiras se pode transitar reto, oblíquo, ou transversalmente, sem as regras civilizatórias dos sentidos, ou “mãos” normatizadas pela convivência no mundo civilizado. O mundo civilizado do cartesianismo e do iluminismo nunca superou a escolástica no Brasil, apesar da Pesquisa Científica, dos marxismos, apesar da Pós-modernidade, apesar dos estudos decoloniais.
Do ainda degrau que representa a calçada da historiadora togada, penso como brasileira. Não falo do verde-amarelo bragantino-habsburguense da Bandeira. Esta eu conheci por Bilac, parnasiano, e seu Hino: “símbolo da terra”, que cantávamos, crianças escarnecedoras, “símbalo”. Mas o Hino da Independência era o mais troçado: “Japonês tem quatro fiiilhos”. Falo do pano esgarçado pelo tempo, do tecido queimado pelo sol, sujo e áspero.
E faço o mea-culpa por permitir que a pedagogia de Paulo Freire seja reproduzida como método (das perguntas e respostas da dialética escolástica) e não como ação de fazer (presente para futuro) a esperança em que o educador, realmente, seja educando.
Preciso me perguntar se (a conjunção condicional ou causal: o inexistente da História) e quando nós, “senhores do tempo”, eliminamos o fazer e refazer constante das leituras do mundo para nos apaixonarmos pelo fetiche do produto pronto e acabado do texto publicado nas Revistas Indexadas?
Quero menos romantismo e mais realismo das gentes das ruas nas salas de aula e nos “escritórios” nos quais nos fechamos. Que sejamos intérpretes e vozes dos gentios, escravos e índios que ainda perpassados pelo crivo histórico dos conceitos, e que estejamos prontos para a intervenção, construção e reavaliação de todos os Direitos e Liberdades de Re-Existir com todxs.
É preciso que rompamos todas as dicotomias e enclausuramentos contemplativos do Passado, pois “a História é um carro alegre” (BUARQUE & MILANEZ. Canción Por La Unidad Latinoamericana, 1976). O racismo estrutural, como nos “lembrou” Silvio de Almeida, está presente. O ovo da serpente eclodiu, como tanto nos alerta Francisco Carlos Teixeira da Silva. Mas ainda permanecem dentro. Não podemos nos negar a sair à rua. A calçada também não é mais segura.
Do lugar de educanda que sou, que aprendo todos os dias com o trabalho de tantos historiadores brasileiros, e da historiadora-educadora que sou, eu declaro meu voto pela Democracia contra o candidato que pretende a continuidade desta penumbra assustadora na qual vivemos. Voto por meus filhos, pelos estudantes da Educação Básica e Superior, por suas mães e pais, educadores de pessoas éticas e inteligentes que eu conheci nas Escolas de todos os graus de Ensino, no candidato do Partido dos Trabalhadores. Quero estar feliz de novo e sem medo de atravessar a rua.
Marcia Regina da Silva Ramos Carneiro é professora Associada do Departamento de História do Instituto de Ciências da Sociedade e Desenvolvimento Regional da Universidade Federal Fluminense (UFF/Campos) e Docente do Mestrado/ProfHistória do Instituto de História da UFF/Niterói
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